Entender como começou o São Paulo não é uma tarefa das mais fáceis. Não adianta querer resumir a história com ternura, como “fulano, beltrano e sicrano se juntaram, cada um escolheu sua cor preferida e assim nasceu o Tricolor”.
Era começo do século XX, e nessa época as coisas eram enroladas. A trama essencial do enredo é a seguinte: em 1900, foi fundado o Clube Atlético Paulistano (cujas cores eram branco e vermelho), time do mítico Friedenreich, equipe que ganhava tudo nas ligas amadoras das três primeiras décadas do século. Só que o clube não queria saber de profissionalizar seus jogadores e, então, decidiu acabar com o departamento de futebol. Outro clube, a Associação Atlética das Palmeiras (que era alvinegra), resolveu fazer o mesmo.
Em 1930, órfãos dos dois lados se juntaram para criar o São Paulo da Floresta – com o vermelho, o branco e o preto como suas cores.
O time, que passou a reunir dois dos maiores nomes da pré-história do futebol brasileiro - Friedenreich e Araken Patuska – conseguiu seu primeiro título paulista em 1931 e fez história outra vez em 1933, quando venceu o Santos por 5 x 1 na primeira partida profissional de futebol do Brasil.
Só que, como sempre, apareceu o dinheiro para complicar. Por causa de uma dívida, o São Paulo da Floresta teve que se fundir com o Tietê e mesmo assim, em 14 de maio de 1935, foi dissolvido. Mas a semente já estava plantada: 20 dias depois, em 4 de junho, um grupo de ex-sócios do São Paulo da Floresta assinou a criação do Clube Atlético São Paulo.
Em 16 de dezembro daquele ano, o nome foi alterado para São Paulo Futebol Clube – e aqui sim começa de verdade nossa história.Ainda levou um tempo até que a versão definitiva do clube engrenasse, mas quando isso aconteceu foi para realmente passar a fazer companhia aos grandes Corinthians e Palestra Itália. Três fatos foram essenciais para isso: uma nova fusão, com o clube Estudante Paulista, em 1938;
o arrendamento do estádio do Canindé; e, em 1942, a primeira grande contratação de sua história. Por inimagináveis 200 contos de réis, com fama de “bonde” que já havia passado por sua melhor fase, chegou Leônidas da Silva, o “Diamante Negro”. Se o melhor momento de sua carreira já havia passado ou não,
pode-se até discutir, mas o fato é que, com o atacante, o Tricolor foi campeão paulista cinco vezes naquela década: em 1943, 45, 46, 48 e 49. Nas três últimas conquistas, contando com aquela que talvez tenha sido a linha média mais famosa do nosso futebol na primeira metade do século XX: os “Três Mosqueteiros” Rui, Bauer e Noronha.Até então, tudo parecia estar caminhando muito bem, obrigado. Mas o São Paulo acabaria embarcando num sonho que, por polêmico que tenha sido à época, acabou gerando frutos até hoje. Decidiu-se correr atrás da construção de um grande estádio. E, em 1952, o então presidente Cícero Pompeu de Toledo inaugurou a pedra fundamental, no meio de um terreno que não poderia ser mais ermo e desabitado. “Loucura”, pensou a maioria. E isso porque, a princípio, alguns títulos ainda continuaram pipocando: os Paulistas de 1953 e, principalmente, o de 57 – capitaneado por duas lendas, o mestre Zizinho e Canhoteiro, o “Garricha do lado de lá”.
Foi bom aproveitar, porque o que se seguiu foi um jejum que fez do clube mais assunto entre o pessoal da engenharia civil do que do futebol. A primeira etapa da construção do Morumbi foi inaugurada em 2 de outubro de 1960: vitória por 1 x 0 sobre o Sporting de Lisboa. Mas só dez anos e 70 milhões de dólares depois é que o sonho finalmente virou realidade. Em 1970, a obra foi concluída.i
E, coincidência ou não, voltaram os títulos: em 70 - com Forlán, Roberto Dias e Toninho Guerreiro - e, no ano seguinte, já com dois monstros no meio-campo, Gérson e Pedro Rocha.
As coisas estavam ficando claras: o São Paulo era um dos grandes times do estado e dono do maior estádio particular do mundo. Mas estar na elite do futebol paulista ainda parecia pouco. Quando o Campeonato Brasileiro passou a existir, foi a vez de o time alçar vôos maiores, algo que aconteceu a partir da década de 70. Depois de dois vice-campeonatos – em 71 e 73 -, o título inédito chegou em 1977, em Belo Horizonte, na disputa de pênaltis. O Atlético-MG até que tinha mais time, mas o São Paulo tinha a garra de Chicão e os gols de Serginho Chulapa. Foi o primeiro passo para ter uma imagem de vencedor em todo o País. A década de 80 se responsabilizaria pelos passos seguintes: Oscar, Darío Pereyra, Falcão e os “Menudos” Careca, Silas, Müller e Sidney. Montar esquadrões virou praxe, e o bicampeonato brasileiro em 1986 deixou isso bem claro.O estado de São Paulo, o Brasil e, finalmente, a América do Sul (e por que não o mundo?). A trajetória são-paulina seguiu essa lógica. Por causa dos títulos internacionais e da qualidade de sua infraestrutura – especialmente o Centro de Treinamento da Barra Funda, construído em 1988 -, o São Paulo virou referência de clube brasileiro organizado e viu sua torcida cresce desmedidamente. Também, quem não gostaria de torcer para o time durante a era Telê Santana? Foram dois títulos consecutivos da Libertadores da América, cada um seguido de um título da Copa Intercontinental, no Japão – primeiro contra o Barcelona, depois contra o Milan. Raí, Palhinha, Cafu, Müller – aquele São Paulo de repente passou a ser colocado na mesma frase que “Santos de Pelé” como esquadrões mais vitoriosos do Brasil no exterior.
O auge do sucesso internacional do São Paulo, no entanto, coincidiu com o crescimento rápido e descontrolado da tendência exportadora do futebol do Brasil: todo craque que se destacava aqui, imediatamente virava negócio para Europa. Com isso, ser time de glórias passou a ser sinônimo de negociar jogadores: começou com Raí para o Paris Saint-Germain em 93. A partir daí, Juninho, Edmílson, Denílson, Kaká, Luís Fabiano... Todos que ajudaram o Tricolor a conquistar títulos durante a década de 90 e começo dos anos 2000 acabaram partindo para a Europa.
Quando essa tendência passou a ser, definitivamente, a realidade do futebol brasileiro, o São Paulo foi um dos clubes que melhor se adaptou: a fama passou a ser a de conquistar jogadores que atuam na Europa para se recuperar no CT bem equipado e a de contratar bem dentro das possibilidades do mercado. Veio o tri da Libertadores em 2005, coroado com um título do Mundial de Clubes, contra o Liverpool – o auge da geração que tem como ícone maior o goleiro-artilheiro Rogério Ceni. Em 2006, 2007 e 2008, mais três títulos nacionais, para chegar ao hexa. A fama de clube organizado só foi arranhada em 2010. O São Paulo teve três técnicos ao longo da temporada (Ricardo Gomes, Sérgio Baresi e Paulo César Carpegiani) e completou dois anos sem nenhum título. Em 2011, depois de sete anos disputando a Copa Libertadores, o time volta à Copa do Brasil na tentativa de retomar sua trajetória de conquistas.